DOC: simples loucura
E por acaso é preciso estar pronto para que algo aconteça contigo? Acho que é mais fácil as coisas irem acontecendo e a gente ir se adaptando e moldando a situação do que já estarmos prontos e esculpidos para quando algo acontecer conosco.
Mas acho que o que aconteceu comigo não se encaixa muito neste sentido. Foi sem querer: eu estava fazendo alguns cálculos no laboratório e de repente, puf, surgiu a resposta para o que estava acontecendo. Porque, não é fácil tentar desvendar o mistério de coisas sumindo e aparecendo em lugares diferentes. Por exemplo: é engraçado pensar como todo mundo aceita a ideia de que uma vida some e vai para um lugar que ninguém conhece e que, também, esta vida nunca mais vai voltar. Quando alguém morre, todo mundo acha que foi por causa de uma fatalidade, um acidente, uma doença, o destino ou a vontade de um ser superior. Mas ninguém fica pensando para onde exatamente esta vida foi, como ela acabou indo embora e coisa do tipo.
Para mim, uma vida só se vai quando o tempo resolve sugá-la. Simples: o tempo tira o tempo de uns para dar aos outros. Ou talvez o tempo queira aquele tempo para que ele continue existindo. Ou talvez o tempo faça isso apenas para que todos tenham medo dele, tenham medo que ele passe. Eu acho que o tempo é como se fosse um sujeito que é bem vaidoso, que todos respeitam, que todos acham que é perfeito, mas que ninguém para para enxergar seus defeitos, seu calcanhar de Aquiles. E quando eu resolvo fazer isso, todo mundo acha um absurdo: se vocês não quiseram ver isso antes, o problema é de vocês, e não meu!
E eu sempre pensei que o tempo tinha uma grande falha: o tempo que ele se esquecia ou o tempo que ele não tinha tempo de organizar ou cuidar, ficava num lugar aberto, onde bastava abrir uma janela e lá estava ele. É como se fosse um lugar preenchido com tempo perdido. É o tempo ocioso, o tempo daqueles que se foram, o tempo que ainda está por ser usado (mas que ainda está sendo planejado). E, possivelmente, as vidas que se foram, devem estar lá.
E eu já tinha descoberto antes que o tempo é um tipo de energia, então só precisava descobrir coo usar aquela energia. A quantidade de cálculos que eu teria que fazer era infinito, sem contar que eu não sabia por onde começar. Então eu fui para o laboratório do meu amigo, onde tinha uma máquina que a gente tinha feito para fazer com que as imagens de algum tempo passado se projetassem numa tela. É claro que par chegar naquele laboratório não foi nada fácil: primeiro eu tive que sair correndo daqui (e tinham tantos enfermeiros de plantão que eu achei que não fosse conseguir sair. Mas deu tudo certo nessa fase, mesmo com a perna doendo), depois eu tive que achar um jeito de abrir a porta do prédio (deve ter sido trocado por segurança, e minha chave antiga não iria servir para nada), aí eu acabei entrando pela porta dos fundos (já que a senha continuava a mesma). Quando eu cheguei lá, a máquina tinha sido modificada e arrastada para uma salinha pequena e sem utilidade alguma. Tive que reprogramar a dita cuja, mas como não tinha mais os códigos, fui fazendo do jeito que eu achava que daria certo.
Quando aquela coisa ligou, foi como um prêmio! Mas, então, eu percebi porque ela havia sido desativada: os tempos utilizados e projetados na tela haviam se acumulado. Qualquer coisa poderia trazer um buraco no tempo (talvez, até mesmo literalmente). Então eu troquei aquela tela por um buraco (literalmente eu fiz um buraco naquela máquina), sobrecarreguei todas as suas funções e.. pronto! Vi o que ninguém mais poderia ter visto, fiz o que, talvez, eu jamais iria conseguir fazer e, então, eu resolvi voltar para contar para todo mundo. O único problema foi que ninguém acreditou em mim. Acho que é por isso que estou assim, aqui.
Mas de uma coisa eu tenho certeza: um dia vocês ainda verão como tudo era verdade. Vão acabar por descobrir que eu não errei. E se errei, foi em tentar contar o que descobri à vocês.
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