A vida íntima do público

   O Museu estava mais calmo do que no domingo (quando o movimento é bem maior). A praça estava apenas preenchidas pelos pássaros e pombos.
   Ambos andavam um tanto quanto incomodados, mas ninguém sabia o motivo, apenas passavam por eles ignorando-os. Então, naquele dia tranquilo, eles resolveram colocar o preto no branco:
   _ Ei, Museu…
   _ O que foi?
   _ E aquele lance? Ainda está de pé?
   _ Caramba, lá vem você de novo com essa história de greve… Não sei não, acho que isso não vai dar nada certo. Especialmente por causa do motivo.
   _ Você e esse seu pessimismo. Se nunca fizermos, não saberemos se dará certo ou não.
   _ E o que você propõe?
   _ Eu tenho um orelhão bem ali. A gente pode ligar para uns grafiteiros e pedir para eles fazerem algumas faixas e colocar nos meus postes e nas suas portas. O que você acha?
   _ Mas o que você pretende escrever nestas faixas?
   _ Somos públicos, mas também temos o direito de ter uma vida privada.
   _ E o que mais?
   _ Ué, se é uma greve, a gente para de funcionar. Simples.
   _ Só isso?
   _ Bom, eu não sei quanto a você, mas eu sou fixo, não tem como fazer uma passeata pela cidade. Dá para colar uns cartazes aqui e outros ali, fazer o negócio da faixa e… Já sei, a gente podia fazer um jingle e ficar cantando o dia inteiro.
   _ Nem vem, se eu odeio os jingles desses políticos, imagina ficar cantando o dia inteiro. Mas que ideia troncha…
   _ Mas você gostou das outras ideias?
   _ Olha eu não sei não, viu? Acho que isso pode sujar a nossa reputação.
   _ Vem cá, semana passada você estava todo animadinho e concordando com tudo, de repente, você resolveu dar para trás. O que está acontecendo?
   _ Nada, é só a minha opinião.
   _ A única coisa é que a sua opinião da semana passada não está batendo com a de hoje. Semana passada você nem se lembrava que tinha uma reputação a zelar e queria botar fogo em tudo, e hoje você fica aí, amarelando. Que foi? Não quer mais ter uma vida privada? Desistiu da sua vida íntima?
   _ Desculpe, mas eu sou um Museu de nome, e tenho que zelar por ele. Semana passada eu era apenas um cara imaturo dando um de rebelde.
   _ E esta semana você é o bonzão que não quer contar o real motivo pro seu amigo e isto está me irritando profundamente.
  _ Foi mal, mas você pode fazer o que bem entender, é apenas uma Praça.
   _ Agora você está dizendo que eu não tenho um nome à zelar? Tenho sim, viu? Se não fosse por mim, muitas famílias não teriam uma belo dia de lazer, piquenique e muitas risadas.
   _ Não é isso, é só que você tem mais liberdade que eu, é mais aberto. Eu sou todo fechado, sei lá.
   _Quer saber o que eu acho? Acho que você não quer mais ser meu amigo. Depois de tantos anos, tantas conversas, você faz isso comigo?
   _ Não é isso… É que, é difícil, sabe?
   _ O que?
   _ Quer saber? Não é nada, não. Está tudo bem.
   _ Me conta.
   _ Ai, está bem. Semana passada um funcionário deixou o computador ligado. Aí eu não resisti e fui mexer. Entrei em tantos sites legais, e fiz muitos perfis. Aí, no domingo, eu conheci uma pessoa linda, sabe?
   _ Pessoa?
   _ Não exatamente uma pessoa, mas uma moto. Ai, ela é linda, divertida, alegre, jovem. Ela é perfeita. A gente conversou bastante e marcamos de nos encontrar esta semana. Acho que estou apaixonado.
   _ Então é assim? Você faz perfis em tudo quanto é canto e nem para me adicionar? Poxa, eu até estou contente por você, mas custava ter dito isso antes? Você é meu melhor amigo!
   _ Eu sei, mas não queria parecer precipitado.
   _ Mas me diz uma coisa, essa sua gata, a moto, tem uma amiga?


[CONTINUA]


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