Onde está Verônica?
Convivo com dores constantes: os dedos, as costas, o coração. Me casaria toda vez que me apaixonasse? Ao som de suas notas, de seus toques, de sua música, de sua loucura me ponho a escrever como um tiro no escuro, tentando me lembrar da forma das letras e das palavras no canto certo, na lacuna do papel. Criei sobre sua criação. Criei em você um filho da sua voz com a sua mão que dedilha o violão como se brincasse; como se moldasse a minha imaginação ou meu pensamento ou a mim mesma. Como se falasse, como se fosse um personagem, como se atuasse me força a ir a um lugar imaginário: é uma violência, uma invasão e eu desejo que continue. Qual o seu limite? Quer esbarrar nas minhas fronteiras.
Tempestade no MAR. Goteira no teto da casa. Corrente que escorre pela parede e enche meu prato. Saboroso medo de estar alimentando-me de sua fúria, esta fúria que me move e me acalma por constatar que vivo. Enchente.
Estamos em cantos distantes da mesma cidade, ouço o mesmo canto que os pássaros de sua gaiola fazem, ouço o mesmo grito da chaleira de sua cozinha, ouço as mesmas palavras que você escreve em minhas canções. Sentimo-nos igualmente desconhecidos e solitários e ligados da forma mais vazia que se possa querer. Guardo seu lugar na cadeira ao lado da minha e o espaço no armário continua aberto com exclusividade para você. Sinto o cheiro do seu cabelo sujo lambuzar a fronha e o frescor da pele molhada e dos dedos espumando pelo corpo em meio ao quente vapor do banho que não compartilho com você. Vejo a mesma mancha no lençol e sinto saudades.
Onde está aquela janela ensolarada no meio do centro encardido que tanto amamos? Aquele sofá surrado onde jogamos nossa desgraça para ver tv e fingir intimidade? Onde está o cinzeiro em forma de canoa que servia de enfeite em nossa varanda? Onde estão as nossas cinzas que jogamos ao vento frio? Onde estamos?
Quero cruzar com você pela rua sem saber que é você para ver se você é o meu você. Quero tomar um café e quero um cafuné e quero andar sem compromisso e quero você.
Você? Ou ele? Quero ele. Quero ele com canela e açúcar caramelado. Quero deixar você melado, velado, vetado. Quero ele aquele nele.
Sou abafada. Calo e deságuo neste silêncio e voto desesperadamente pela volta. Retornar da viagem como uma criminosa, deportada desse estado hipnótico.
Sou barulho: o ronco da barriga, o estalar dos ossos, o arranhar da garganta, o respirar sem ar, o afogar, o afagar, o abandonar.
Morre mais uma sinfonia por insônia, por fadiga, por rancor, por amor, por ter mergulhado sem saber como retornar a superfície. Visco do risco de fisgar. Plana ao meu redor essas notas agudas que me impedem de ignorar seu cheiro, seu gosto, seu som. Essas notas que por não poder descrever de tão cheias que me inflam e me incitam a subjetividade e tudo torna-se vazio, sugado pela escassez que lhe trouxe ao óbito, uma inconveniente decomposição dos vermes e traças de suas peças quebradas. Fragmentos de um experimento, de um corpo sem conserto.
Meu consolo é a obra do seu concerto que deixou a sala vazia e as poltronas manchadas. Composição do nosso desencontro. Desentendimento dos nossos passos tortos, derretidos pelas solas desgastadas.
Tempestade no MAR. Goteira no teto da casa. Corrente que escorre pela parede e enche meu prato. Saboroso medo de estar alimentando-me de sua fúria, esta fúria que me move e me acalma por constatar que vivo. Enchente.
Estamos em cantos distantes da mesma cidade, ouço o mesmo canto que os pássaros de sua gaiola fazem, ouço o mesmo grito da chaleira de sua cozinha, ouço as mesmas palavras que você escreve em minhas canções. Sentimo-nos igualmente desconhecidos e solitários e ligados da forma mais vazia que se possa querer. Guardo seu lugar na cadeira ao lado da minha e o espaço no armário continua aberto com exclusividade para você. Sinto o cheiro do seu cabelo sujo lambuzar a fronha e o frescor da pele molhada e dos dedos espumando pelo corpo em meio ao quente vapor do banho que não compartilho com você. Vejo a mesma mancha no lençol e sinto saudades.
Onde está aquela janela ensolarada no meio do centro encardido que tanto amamos? Aquele sofá surrado onde jogamos nossa desgraça para ver tv e fingir intimidade? Onde está o cinzeiro em forma de canoa que servia de enfeite em nossa varanda? Onde estão as nossas cinzas que jogamos ao vento frio? Onde estamos?
Quero cruzar com você pela rua sem saber que é você para ver se você é o meu você. Quero tomar um café e quero um cafuné e quero andar sem compromisso e quero você.
Você? Ou ele? Quero ele. Quero ele com canela e açúcar caramelado. Quero deixar você melado, velado, vetado. Quero ele aquele nele.
Sou abafada. Calo e deságuo neste silêncio e voto desesperadamente pela volta. Retornar da viagem como uma criminosa, deportada desse estado hipnótico.
Sou barulho: o ronco da barriga, o estalar dos ossos, o arranhar da garganta, o respirar sem ar, o afogar, o afagar, o abandonar.
Morre mais uma sinfonia por insônia, por fadiga, por rancor, por amor, por ter mergulhado sem saber como retornar a superfície. Visco do risco de fisgar. Plana ao meu redor essas notas agudas que me impedem de ignorar seu cheiro, seu gosto, seu som. Essas notas que por não poder descrever de tão cheias que me inflam e me incitam a subjetividade e tudo torna-se vazio, sugado pela escassez que lhe trouxe ao óbito, uma inconveniente decomposição dos vermes e traças de suas peças quebradas. Fragmentos de um experimento, de um corpo sem conserto.
Meu consolo é a obra do seu concerto que deixou a sala vazia e as poltronas manchadas. Composição do nosso desencontro. Desentendimento dos nossos passos tortos, derretidos pelas solas desgastadas.
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